Maria de Lourdes do Carmo tem 68 anos e mora em Mantiqueira, na zona rural de Santos Dumont. Como tantos outros brasileiros, Lurdinha sonhava como uma aposentadoria digna e tranquila, após anos de trabalho duro. 

Mas em 2024, a trabalhadora percebeu o desfalque de R$ 45,00 nos vencimentos no Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). Descontos que se repetiram por 10 meses em nome de uma associação, que segundo a própria aposentada, ela nunca fez parte e sequer tinha conhecimento. "Não autorizei desconto, nunca assinei nada, não abri conta, nada nada", afirma a aposentada.  

Lurdinha trabalha desde os 7 anos no campo e se revolta com a situação vivida por ela e por outros aposentados e pensionistas.

"Fiquei chateada porque a gente precisa do dinheiro, pago médico de R$ 300, compro remédio de R$ 500 e no final das contas não me sobra nada, esse dinheiro está me fazendo falta até pra saúde. A gente quando tem pouco estudo, a gente é mais simples, tem que arrumar advogado pra receber R$ 1.500,00 é um absurdo pro Brasil", desabafa a aposentada.

Lurdinha teve o auxílio do advogado Marcello Filgueiras, que orientou a idosa. "Pra muitas pessoas isso é quase um décimo terceiro, se a gente pegar todos os descontos que ela teve. Isso porque ela notou em novembro os descontos de R$ 45,00. Eu brinco que ela foi mais rápida que a Polícia Federal pra pedir explicações", diz Marcello.

Como no caso de Lurdinha, outras milhões de pessoas foram vítimas do chamado golpe do INSS. As investigações da operação "Sem desconto" da PF apontam para um rombo na casa dos R$ 6 bilhões. Aqui em Santos Dumont, aproximadamente 1 mil pessoas teriam sido vítimas dos descontos irregulares até o momento.

Atuação do Procon já apontava para proporção do esquema criminoso

Em fevereiro de 2025, antes da operação da Polícia Federal ser deflagrada em todo território nacional, o Portal 14B já havia mostrado a atuação do órgão municipal contra as entidades associativas em Santos Dumont. Duas delas, na época foram multadas: a Ambec foi condenada a pagar R$ 35 mil, e o Sindicato Nacional dos Aposentados do Brasil 15 mil.  Mas segundo o próprio Procon, as reclamações de descontos irregulares vêm desde 2021 na cidade.

"Essa questão das associações e sindicatos que estourou com a PF é uma coisa recorrente que a gente já sabia que ia dar algum problema, era muita demanda, descontos que vinham aumentando. Embora isso seja antigo, mas nos últimos anos a gente via o aumento. Quando assumi o Procon em janeiro deste ano já havia processos abertos e nós abrimos ainda mais. Desde janeiro, multamos 8 associações e sindicatos e tem outros. Eu creio que tivemos por volta de 1000 pessoas lesadas na cidade", disse Umberto Palmieri, diretor do Procon.

Das 8 associações multadas, 4 buscaram acordo por meio de Termo de Ajuste de Conduta (TAC). O valor ressarcido ao contribuinte precisa ser em dobro. 

Governo trabalha para ressarcir as vítimas

Nessa semana, 9 milhões de beneficiários que tiveram descontos (autorizados ou não) começaram a ser notificados pelo INSS para informar qual associação realizou o desconto e o período em que a cobrança foi realizada, tanto pelo aplicativo 'Meu INSS', quanto pela central de atendimento, no telefone 135.

O segurado poderá confirmar ou contestar o vínculo de forma digital. Caso não tenha autorizado, será solicitada a devolução dos valores.

As associações que forem contestadas terão 15 dias úteis para apresentar documentos que comprovem a filiação, a autorização para desconto e a identidade do segurado. Caso não comprovem, deverão devolver os valores cobrados indevidamente.

O pagamento será feito por uma guia à união, só depois por meio do INSS o dinheiro será repassado para a conta do beneficiário.

Foto: Peterson Escobar / Reprodução